As transferências de futebol são como casamentos (1ª parte)

Dois historiadores de arte contemplam um quadro surrealista. Um vira-se para o outro e diz “pensei que fosse mais gordo”. Ao que o segundo responde, “Não, é Magritte”. 

Mas não percamos mais tempo. Quando um futebolista se casa, é habitual lermos na imprensa títulos como “Joaquim junta-se ao clube dos casados”, ou um lacónico “Betinho tem novo clube”. Mais tarde, descobrimos que o novo clube se chama afinal Futebol Clube da Fernanda ou Elisabete United, e não joga na Champions. 

Em muitos aspectos uma transferência é exactamente como um casamento. A forma como os jornais desportivos anunciam as transferências de jogadores podia muito bem ser aplicada a relacionamentos amorosos: “Arnaldo faz proposta por Armanda”, “Luisinho vai avançar por Carlota”, “Roberta já não escapa”, “Rute quer dar o salto, mas Ricardo Jorge dificulta saída”. 

O período de transferências coincide com a altura em que se celebram mais casamentos, o Verão. E para ambos existe um período de lua-de-mel. A lua-de-mel acaba quando o recém-casado descobre que casou com alguém cujo hálito matinal é comparável à atmosfera de um planeta inabitável, e que a única coisa que tem de fofinho são pilosidades em sítios inesperados. Normalmente quando isto acontece é já demasiado tarde para voltar atrás no empréstimo para compra de um T2 em Massamá. Não é, pois, a despropósito que se usa a expressão “contrair matrimónio”. Tal como quem contrai uma doença, também envolve sérios riscos para a saúde e que podem deixar sequelas para toda a vida. 

No caso do futebolista, a lua-de-mel termina quando o seu novo clube descobre que a que a única coisa que o jogador tem de craque é o som que o joelho dele faz quando corre. E assim, no amor e na bola, é num ápice que se passa de bestial a bosta. 

Hoje em dia tanto casamentos como contratos de futebol são tão pouco duradouros que em vez da expressão “dar o nó”, se devia dizer “prender com velcro”. Apesar de se comprometerem até que a morte os separe, os noivos sabem muito bem que vão sair abaixo da cláusula de rescisão. Seria mais realista que os casamentos fossem mais como os contratos de futebol, e em vez de serem para toda a vida, tivessem uma duração de 5 anos (ou de 1 ano com outro de opção, se algum dos noivos já acusar alguma veterania ou tiver um historial de lesões). E se uma transferência é comparável a um casamento, o que é afinal uma união de facto, se não um empréstimo com opção de compra? 

No amor e no futebol fazem-se juras de amor eterno, com mais tendência a serem quebradas que a anca de uma velha. Ao assinarem pelo novo clube, os futebolistas dão beijinho no emblema e afirmam que “sou deste clube desde pequenino” (o que só lança dúvidas sobre a seriedade de quem inventou osistema métrico). O “sou deste clube desde pequenino” é o equivalente futebolístico ao “amo-te desde o dia em que te vi”, e têm ambos um prazo de validade semelhante à pílula do dia seguinte: vale para as próximas 72 horas.


(continua)

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