Se a minha auto-estima fosse uma série do NETFLIX: Part deux

Eu acho que só vou ter uma boa auto-estima no dia em que se fizerem transplantes. Primeiro era preciso estar meses à espera, à procura de um dador compatível. E mesmo que o encontrassem, haveria sempre o risco de rejeição: se alguma me transplantassem com uma auto-estima ia haver grandes probabilidades do meu corpo ser rejeitado. 

Cenário possível: Uma ambulância chega às urgências. Os paramédicos saem a correr e transportam-me numa maca. Estou todo entubado, com colar cervical ao pescoço e com respiração artificial. O meu estado é muito grave. O médico pergunta “Sra. enfermeira, qual a condição do paciente?”. 
Não sabemos doutor. O paciente tem historial de ser pouco assertivo e de ser excessivamente dependente da aprovação dos outros.” 
Já tentaram administrar-lhe auto-confiança?” 
Não podemos doutor, ele é alérgico.”
O médico pega no raios-X e olha, horrorizado: “Oh meu deus, este homem não tem qualquer auto-estima... Enfermeira, prepare o Bloco Operatório, este homem tem de ser operado imediatamente!”.
O meu estado é agora crítico, não há tempo a perder. 
Finalmente, conseguem estabilizar-me. Injectam-me com 1mg de amor-próprio e 15 cc de respeito próprio. Mas não chega. “Estamos a perdê-lo, doutor”, grita a enfermeira, desesperada. 
O que fazemos doutor?” 
Só há um homem que o pode salvar.”, diz o médico. 
Chega uma ambulância. Os paramédicos trazem uma caixa térmica com uma imagem do Gustavo Santos na tampa. “Rápido, não há tempo a perder, todos os minutos contam!” ouve-se alguém dizer. Os meus pais chegam finalmente às urgências, desesperados por notícias do filho. Após várias horas no bloco operatório, o médico sai. Tem um ar extenuado e derrotado. 
Então doutor, novidades?”, pergunta a minha mãe, tentando conter as lágrimas. 
Tenho más notícias. Infelizmente, as lesões internas eram demasiado graves, já não fomos a tempo de o salvar. O seu filho vai passar o resto da vida em relacionamentos destrutivos e a comparar-se aos outros.

FIM.

Se a minha auto-estima fosse uma série do NETFLIX


Uma das consequências do meu problema da fala é que tenho uma baixa auto-estima.
Tenho dificuldades em afirmar-me, em ser mais assertivo, dizer o que penso, o que quero ou o que sinto. Para mim a auto-estima é como aquelas séries do Netflix, que toda a gente fala, e toda a gente viu, menos eu. 
- Conheces Auto-estima
- Ya, já ouvi falar, mas nunca vi. 
- Epá, tens de ver. Ias adorar. 
- É sobre o quê? 
- Basicamente é sobre ti, acerca gostares de ti próprio, de achares valor em ti mesmo. 
- OK, então é de Ficção Científica. 
- Não, não. Tem a ver com confiança em ti mesmo e aceitares-te como ti alguém que merece ser feliz. - Mas depois há um twist, não? 
- Não, não. Vê e depois diz-me o que achaste.

Sento-me finalmente para ver e leio a descrição do Netflix: 
Auto-estima, uma mini-série sobre amor próprio, que era para ter sido lançada mais cedo, mas não foi, com medo da rejeição”. 
Auto-estima, a mini-série que é tudo aquilo que você quer que ela seja, porque anseia por validação externa.” 
Auto-estima, a mini-série tão insegura das suas capacidades que não tem sequer um trailer.
Auto-estima, a mini-série com tremendas flutuações de humor, que não aborda nenhum assunto, pois evita o confronto.” 
Auto-estima, a mini-série cuja dependência extrema dos seus espectadores afastou aqueles que até gostavam dela.” 
Auto-estima: cancelada.

E depois nas sugestões surge ainda: 
Se perdeu a série Auto-estima, não perca o seu spin-off Capitão Passivo-Agressivo: o super-herói com poderes de bipolaridade e que combate o crime mandando indirectas as quais ninguém tem a certeza quem é o verdadeiro alvo."