Uma
queda da cadeira precipitou o final da vida de António de Oliveira Salazar. Na
verdade, não foi a primeira vez que Salazar caiu da cadeira. Pese o seu génio
para os números, Salazar era algo inapto com cadeiras.
Fonte de desconforto e embaraço, esta incapacidade foi escondida durante anos
por Salazar, que evitava estar na presença de cadeiras, bancos, sanitas e
bidés. E, obrigado a sentar-se, não o fazia sem o auxílio de um terço e uma
imagem dos pastorinhos. O que se segue é o relato verídico, e de um valor
histórico inestimável, da penosa relação entre António de Oliveira Salazar e as cadeiras, das quais passou a vida inteira a cair e a erguer-se. E a cair
novamente.
Cadeira
Zigzag, Gerrit Rietveld (1934)
O
Presidente do Conselho sofreu muito com a cadeira Zigzag, que fazia dos joelhos
de Salazar as suas vítimas preferenciais. À conta da cadeira Rietveld, Salazar
terá sofrido várias lesões, entorses, roturas de ligamentos, fracturas da
rótula, tendo inclusivamente partido a tíbia, o perónio e o períneo. Não espanta,
por isso, que o uso de joelheiras e caneleiras fosse obrigatório junto da
cadeira.
Salazar
notava com agrado que o ziguezague evocava as duas letras dominantes no seu
nome, o “S” e o “Z”. Ainda assim, Salazar, muito dado a enjoos e a torcicolos, não
podia olhar fixamente para o ziguezague durante mais que alguns segundos (numa
ocasião terá mesmo perdido os sentidos; felizmente a queda foi amparada por um
busto do Cardeal Cerejeira).
Com
efeito, não demorou até que Salazar passasse também a usar um capacete,
especialmente feito a partir de chifres de cabra-montês, os mais adequados para
suportar um eventual impacto. Temiam-se os efeitos da cadeira na digníssima,
mas frágil testa do Presidente do Conselho, acarretando não só riscos
para a Nação, como uma dispendiosa limpeza da carpete suja de miolos,
incomportável para os depauperados cofres da Pátria. Ainda
que extremamente eficaz, todo o aparato de segurança era porém pouco prático.
Apesar de alguns ensaios
“muito satisfatórios”, incluindo um em que conseguiu mesmo sentar três quartos
da nádega esquerda na cadeira, o Presidente do Conselho foi aconselhado a
abandonar definitivamente a cadeira Zigzag.
Contudo, ao seu jeito, Salazar nunca deixou de sentir uma profunda empatia pela
severidade e o despojamento da cadeira, que lhe faziam lembrar a sua pessoa,
elogiando a cadeira Rietveld por ser “poupadinha”, como ele.
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